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Entre o direito e o dever de incluir

  • aprenditoedu
  • 27 de out.
  • 5 min de leitura

DECRETO Nº 12.686, DE 20 DE OUTUBRO DE 2025 Institui a Política Nacional de Educação Especial Inclusiva  1. PRINCIPAIS NOVIDADES

1.1. Nova Política e Nova Rede

Criação formal da Política Nacional de Educação Especial Inclusiva (PNEE-I) e da Rede Nacional de Educação Especial Inclusiva, instrumentos inéditos de coordenação federativa e execução conjunta entre União, Estados e Municípios.→ Antes: o Decreto nº 7.611/2011 não instituía uma rede nacional nem previa estrutura de governança formal.

 

1.2. Substituição da lógica integradora pela inclusiva plena

O novo decreto abandona definitivamente a ideia de “classes e escolas especializadas” como eixo organizador.→ Passa a afirmar que a inclusão se dá em classes comuns, com apoios e adaptações.→ Antes: o Decreto nº 7.611/2011 admitia explicitamente “classes e escolas especiais” como alternativas, o que era criticado por contrariar a Convenção da ONU.

 

1.3. Inclusão explícita do Transtorno do Espectro Autista (TEA)

O art. 1º, §2º reconhece expressamente o estudante com TEA como pessoa com deficiência, garantindo cobertura integral da política.→ Antes: o 7.611/2011 não trazia essa menção direta (a LBI de 2015 consolidou esse entendimento, agora reafirmado no decreto).


1.4. Criação de instrumentos pedagógicos obrigatórios (ou análogos)

Instituição obrigatória de dois novos instrumentos normativos internos:

a)      Estudo de Caso (art. 11): etapa inicial de identificação de necessidades e barreiras.

b)     Plano de Atendimento Educacional Especializado – PAEE (art. 12): documento pedagógico individualizado, de atualização contínua.→ Antes: o 7.611/2011 citava genericamente o AEE, mas sem protocolos pedagógicos formais.

 

1.5. Eliminação da exigência de laudos ou diagnósticos médicos

O decreto proíbe condicionar o AEE ou o apoio escolar à apresentação de laudos, relatórios ou diagnósticos (arts. 11 §7º e 14 §2º).→ Antes: a matrícula e o atendimento dependiam, na prática, de comprovação médica; agora o foco é na funcionalidade e nas barreiras educacionais, em consonância com o modelo biopsicossocial da deficiência (Lei 13.146/2015).

 

1.6. Regulamentação do papel e da formação do profissional de apoio escolar

Define competências detalhadas (locomoção, alimentação, comunicação, interação, etc.) e formação mínima (nível médio + 80h de curso específico).→ Antes: o 7.611/2011 não distinguia formalmente o profissional de apoio do professor do AEE, nem exigia formação específica.


1.7. Formação continuada obrigatória e colaborativa

A União assume papel ativo de cooperação federativa para garantir formação em serviço dos professores do AEE e profissionais de apoio (arts. 13 e 15).→ Antes: o apoio era facultativo e dependia de programas pontuais do MEC.


1.8. Estrutura formal de governança federativa

Introduz governança nacional com coordenação executiva e estrutura consultiva com participação social (art. 20).→ Antes: o 7.611/2011 previa apenas cooperação técnica genérica, sem instância formal de gestão.


1.9. Introdução da metodologia de “trabalho intersetorial”

Determina articulação obrigatória com as áreas de saúde, assistência social e direitos humanos (arts. 2º, VII; 21).→ Antes: essa articulação era apenas sugerida.


1.10. Observatório e indicadores nacionais

Prevê observatório da educação especial inclusiva e aperfeiçoamento de indicadores de monitoramento e avaliação (art. 19, V e IV).→ Antes: não havia sistema nacional de monitoramento estruturado.


1.11. Reconhecimento e valorização de boas práticas

Autoriza o MEC a criar mecanismos de reconhecimento de experiências inclusivas (art. 18).→ Antes: inexistia instrumento formal de certificação ou incentivo.

 

1.12. AEE em todos os níveis de ensino

Estende o AEE também para educação profissional e ensino superior (arts. 4º, §2º e 10).→ Antes: o atendimento era restrito à educação básica.


1.13. Detalhamento do conceito e função do núcleo de acessibilidade

Define juridicamente o que é núcleo de acessibilidade no ensino superior e suas funções (art. 10, parágrafo único).→ Antes: o termo era mencionado em portarias do MEC, mas sem previsão normativa em decreto.

 

1.14. Garantia de tecnologias assistivas e dispositivos digitais

O PAEE deve prever e autorizar o uso de dispositivos digitais portáteis como recursos pedagógicos e de comunicação (art. 12, §4º).→ Antes: inexistia base legal para o uso formal desses instrumentos em sala.

 

1.15. Explicitação da proteção de dados

Introduz adequação à Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) para informações de estudantes com deficiência (art. 12, §5º).→ Antes: o 7.611/2011 era anterior à LGPD (2018) e não tratava do tema.


1.16. Apoio financeiro mais detalhado e ampliado

  • Lista mecanismos de repasse de recursos federais (PDDE, PAR, bolsas, PNLD acessível, recursos de acessibilidade) com base legal expressa (art. 19).

    Antes: o financiamento era mencionado de forma genérica, sem remissões normativas.

 

1.17. Enfoque em “aprendizagem ao longo da vida”

Amplia a abrangência temporal da política, reconhecendo o direito à educação inclusiva permanente, também na vida adulta (art. 3º, II).→ Antes: o foco era a educação básica obrigatória.


1.18. Participação ativa dos estudantes e movimentos de autodefensores

Pela primeira vez, a norma menciona o protagonismo dos estudantes com deficiência na formulação, monitoramento e avaliação das políticas (art. 4º, V, “b”).→ Antes: não havia previsão de participação direta.

⚖️ 2. O QUE FOI MANTIDO (CONTINUIDADES)

  • A transversalidade da educação especial em todos os níveis e modalidades.

  • A manutenção do AEE como complementar/suplementar, nunca substitutivo.

  • A obrigatoriedade da matrícula em classes comuns.

  • A colaboração entre os entes federativos.

  • A articulação intersetorial como diretriz (agora reforçada).

  • O respeito à Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e à LBI.


🚫 3. O QUE FOI REVOGADO (DECRETO Nº 7.611/2011)

Revogação expressa do Decreto nº 7.611/2011 (art. 23).

Este decreto anterior baseava-se em uma visão híbrida, permitindo escolas e classes especiais como parte do sistema, o que agora é superado pelo paradigma inclusivo pleno.

 

⚖️ POLÊMICAS E QUESTÕES JURÍDICAS EM ABERTO


1. Implementação do PNLD Acessível


Questão:Como o Programa Nacional do Livro e do Material Didático (PNLD) assegurará a efetiva inclusão do público da educação especial, considerando a obrigação de produzir e distribuir materiais em formatos acessíveis (art. 19, VII)?


Análise:O decreto menciona o PNLD como instrumento de apoio à política inclusiva, mas não especifica critérios de acessibilidade editorial, prazos ou mecanismos de controle de qualidade. Há lacuna normativa quanto ao padrão técnico dos materiais adaptados (por exemplo: audiolivros, braile, Libras, leitura simples, formatos digitais interativos) e à responsabilidade do ente federativo pela execução. Exige regulamentação posterior por ato do MEC.

 

2. Alcance do Financiamento e Abrangência Institucional


Questão:O financiamento previsto no art. 19 abrange apenas escolas públicas, ou também instituições privadas e confessionais conveniadas sem fins lucrativos?


Análise:O dispositivo faz referência expressa a programas públicos federais (PDDE, PAR, PNLD), que legalmente se destinam à rede pública de ensino. Contudo, o próprio decreto reconhece a possibilidade de convênios com instituições privadas sem fins lucrativos (art. 9º), o que abre margem para repasses indiretos, mediante credenciamento e fiscalização pelos sistemas de ensino. Assim, há interpretação restritiva para escolas privadas com fins lucrativos e possibilidade condicionada para entidades filantrópicas ou confessionais conveniadas.

 

3. Supressão de Exigência de Laudo e Obrigatoriedade de Apoio Escolar


Questão:A dispensa do laudo médico (arts. 11 §7º e 14 §2º) impõe às escolas a obrigação automática de prover profissional de apoio escolar a qualquer estudante com barreiras de aprendizagem?


Análise:A norma estabelece que o direito ao apoio escolar não depende de diagnóstico médico, mas de identificação pedagógica de barreiras e necessidades formalizada no Estudo de Caso e no PAEE.Assim, a obrigação da escola não é automática nem universal, mas decorre da constatação técnica — pela equipe pedagógica — de que o estudante necessita de apoio para garantir acessibilidade e participação.A ausência de laudo não exime a escola do dever de avaliar, registrar e atender à demanda identificada; omissão poderá configurar violação ao direito à educação inclusiva (CF, art. 208, III, e LBI, art. 28).Contudo, a falta de critérios uniformes para caracterização da “necessidade de apoio” pode gerar insegurança jurídica e aumento de judicializações.

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